sábado, 22 de setembro de 2007

Floresta amazônica pode ser mais resistente do que se imaginava

Reação ao estresse hídrico
21/09/2007
Artigo publicado na Science por professor do IAG-USP aponta que limitação de água em períodos de estiagem não impede a recuperação da capacidade fotossintética das folhas, que ficam ainda mais verdes (foto: Museu Goeldi)

Por Thiago Romero

Agência FAPESP – Um artigo publicado na edição desta sexta-feira (21/9) da revista Science aponta que a floresta amazônica pode ser mais resistente do que se imaginava. Mesmo com a pouca disponibilidade de água durante a seca, em vez de declinar, a floresta não apenas se manteve intacta como o verde das folhagens aumentou significativamente.

Segundo um dos autores do trabalho, Humberto Ribeiro da Rocha, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo (USP), que analisou o período de seca entre julho e setembro de 2005 por meio de imagens de satélite, esse fenômeno ainda não havia sido descrito pelos modelos físico-matemáticos que simulam as interações entre a vegetação terrestre e a mudança no clima global.

“As análises indicam uma reação ao estresse hídrico muito mais favorável à sobrevivência da floresta do que se pensava. Essa reação, que ocorreu em médio e curto prazo, manifestou-se na recuperação da capacidade fotossintética das folhas após um período de estiagem muito longo, comparável aos eventos mais intensos do El Niño”, disse Rocha à Agência FAPESP.

A seca que ocorreu na Amazônia em 2005 foi a primeira anomalia climática desde que o satélite utilizado no estudo, o Terra/Modis, da Nasa, a agência espacial norte-americana, foi lançado em 1999 – o que forneceu uma oportunidade única para comparar a resposta da floresta em grandes escalas. As análises foram feitas no sudoeste e na região central da Amazônia.

Apesar da limitação no fornecimento de água às espécies vegetais, o fenômeno poderia ser explicado pela maior disponibilidade da luz solar e pela possível captação de água por meio de raízes profundas capazes de extrair a umidade do solo.

“Há evidências descritas de que as árvores da floresta tropical úmida na Amazônia acessam a água a até pelo menos 10 metros de profundidade nos períodos de estiagem. Trata-se de um reservatório de água disponível sobre o qual as espécies se adaptaram evolutivamente”, explica o professor do Departamento de Ciências Atmosféricas do IAG.

Segundo Rocha, a floresta úmida da Amazônia, em resposta às variações climáticas naturais, tende a aumentar a produtividade no período das chuvas, mantendo uma produção em níveis ainda substanciais na estiagem, quando demanda mais água para compensar o aumento do calor. “É entre o meio e o fim da estação seca, em um período não maior do que dois meses, que a floresta tropical reage e ocorre a rebrota das folhas verdes”, afirmou.

Para ele, o mesmo fenômeno não deve ter ocorrido novamente. “Em 2006 e 2007 não houve padrão de seca como em 2005, que foi uma das secas mais intensas registradas nos últimos 60 anos.”


Fenômenos diferentes, mas interligados

O estudo, no entanto, não indica que a floresta manteve a assimilação de carbono na biomassa, nem que vá manter a produtividade em casos de prolongamento do período de seca. “Nossa expectativa é que o fenômeno identificado não invalide as previsões feitas para a savanização da Amazônia caso o clima se torne sistematicamente mais seco e quente, como alguns modelos globais estão prevendo”, explica Rocha.

O trabalho também não altera a compreensão de como a floresta amazônica é vulnerável a estresses climáticos como o desmatamento e as queimadas, que inclusive podem ser causados pela seca. Mas sugere que a vulnerabilidade da floresta aos efeitos climáticos precisa ser avaliada com cuidado em novos estudos que cruzem informações de observações com os dados dos modelos de previsão climática.

Segundo o professor do IAG, a hipótese de savanização da Amazônia foi concebida com base nas premissas de que um novo estado do clima, mais quente e seco, persistiria e que o ecossistema estivesse em equilíbrio com esse clima, o que demandaria uma escala de tempo de várias décadas.

“A seca da Amazônia em 2005 foi muito intensa, mas, por ter sido um evento transitório, não se enquadra exatamente nessas premissas. Portanto, a comparação não é perfeitamente legítima, apesar de haver uma associação entre os dois pontos, não antagonista, mas complementar, o que deverá ter impacto nas previsões climáticas dos próximos 10 ou 20 anos. São fenômenos de escalas diferentes, mas que podem pertencer a uma mesma dinâmica”, disse.

O artigo também é assinado por Scott Saleska, Kamel Didan e Alfredo Huete, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.

O texto Amazon forests green-up during 2005 drought, de Humberto Ribeiro da Rocha e outros, pode ser lido por assinantes da Science em www.sciencemag.org.

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